ANO 2024 N.º 1

ISSN 2182-9845

Da (in)aplicabilidade da lei dos compromissos e pagamentos em atraso aos serviços municipalizados de natureza mercantil (comentário ao acórdão do Tribunal Constitucional n.º 109/2015)

João Pacheco de Amorim / Fausto Ferreira / Frédéric Teixeira

Palavras-chave

Autonomia local; autonomia financeira; autonomia organizativa; atividade empresarial local.

Resumo

No início da segunda década deste século, a sustentabilidade do sistema financeiro público nacional e a assunção de novos compromissos internacionais por parte do Estado, no âmbito da vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira celebrado com a União Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu, impuseram a criação de mecanismos de controlo da execução orçamental e da despesa pública aptos a assegurar o cumprimento das obrigações internacionais a que o país se tinha vinculado.
Nesse sentido, foi aprovada a Lei n.º 8/2012, de 17 de março, designada por Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso (LCPA), que “estabelece as regras aplicáveis à assunção de compromissos e aos pagamentos em atraso das entidades públicas”, e consequentemente é aprovado também o diploma que desenvolve as bases gerais e princípios da LPCA – o Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de Junho. A LCPA vem restringir consideravelmente a capacidade de decisão financeira pública, e, no que concerne aos municípios, a respetiva autonomia financeira – consagrada nos artigos 6.º, n.º 1 e 235.º e seguintes da Constituição. E é neste contexto que se desenvolve o nosso trabalho, no qual se analisa o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 109/2015, bem como o Acórdão recorrido do Tribunal de Contas - n.º 2/2013, 1.ª S/SS. A questão fundamental passa por saber se os serviços municipalizados com natureza mercantil estão ou não abrangidos pelo âmbito subjetivo de aplicação da LCPA e pelo diploma que a regulamenta. Como segunda questão surge também a necessidade de se aferir da inconstitucionalidade ou não dos normativos dos artigos 2.º da LPCA e do Decreto-Lei 127/2012, quando interpretados no sentido de se incluírem no respetivo âmbito de aplicação os serviços municipalizados com natureza mercantil. Os Acórdãos referidos do Tribunal de Contas e do Tribunal Constitucional (sob anotação) sustentam que a LCA e o diploma que a regulamenta abrangem os serviços municipalizados com natureza mercantil. A nossa posição é contrária a este entendimento, pois entendemos que não ser este constitucionalmente admissível, como procuramos fundamentar de seguida. 

Sumário

1. Uma breve descrição do caso tratado no acórdão sob anotação
2. Primeira questão: a de saber se os serviços municipalizados com natureza mercantil estão ou não abrangidos pelo âmbito subjetivo de aplicação da LCPA e do Decreto-Lei n.º 127/2012 
2.1. Apresentação e modo de abordagem do problema 
2.2. Âmbito subjetivo de aplicação da Lei n.º 8/2012, de 21.02 (Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso) e do Decreto-Lei de Desenvolvimento n.º 127/2012, de 21.06 
2.3. Elemento sistemático e sentido e alcance da remissão do artigo 2.º da LCPA para o artigo 2.º da LEO e deste para o SEC 95
2.4. O conceito de Setor Público Administrativo à luz do SEC 95 e da Lei de Enquadramento Orçamental: os critérios e procedimentos de classificação/reclassificação
2.5. A classificação institucional dos SMTUC à luz do SEC 95
2.6. A “personalidade jurídica parcial”, “empresarialidade” e “mercantilidade” como atributos dos SMTUC
2.7. Aplicação dos critérios de classificação institucional aos SMTUC
2.8. Conclusão: a inaplicabilidade da LCPA e do Decreto-Lei n.º 127/2012 aos SMTUC
3. Segunda questão: a da inconstitucionalidade ou não dos artigos 2.º da LCPA e do Decreto-Lei n.º 127/2012 quando interpretados no sentido de abrangerem serviços municipalizados com natureza mercantil
3.1. Breve recapitulação da questão de (in)constitucionalidade das normas legais em causa tal como foi colocada ao Tribunal de Constas e ao Tribunal Constitucional
3.2. Análise crítica da fundamentação do acórdão sob anotação
Bibliografia