Discretionary; Disciplinary Power; Disciplinary Infraction; Common Disciplinary Procedure; Public Employment Relationship.
The present work aims primarily at analyzing the scope and limits of discretion in the exercise of disciplinary power in the context of public employment.
In this sense, administrative discretion can be defined as the power granted by a competence norm to the Public Administration, allowing it to decide, based on its own judgments and evaluations, ultimately, on the best course of action in a specific situation. However, the administration's choice will always be guided by criteria provided by the general principles and rules of law (in particular, the principles of equality, impartiality, and proportionality). Thus, administrative discretion is present in all branches of Administrative Law and in the realm of disciplinary power in public employment, it is no exception, as it would be practically impossible for the legislator to foresee all situations in which the Administration will have to act, and consequently, it was not possible to establish the best solutions to pursue the public interest.
Indeed, we understand that discretion appropriately accompanies the exercise of disciplinary power, not only in the context of disciplinary offenses but also in various stages of the disciplinary procedure, from its initiation. The administrative body has discretionary power to conduct an initial investigation of the facts to determine whether they indicate the commission of a disciplinary offense and consequently decide whether to initiate the procedure. However, if there is a clear indication of the existence of a disciplinary offense, it has the duty to initiate the disciplinary procedure until the final decision, which may or may not result in the imposition of a disciplinary sanction. This analysis is of utmost importance, as we must not forget that disciplinary power may conflict with the rights, freedoms, and guarantees of workers, potentially even leading to their restriction or elimination.
1. Introdução
O poder disciplinar traduz-se na faculdade de o superior hierárquico punir o subalterno, aplicando-lhe as sanções disciplinares tipificadas na lei perante a prática de infrações, isto é, por violação dos respetivos deveres funcionais
[1]. Ora, o universo do poder disciplinar exige, como veremos, múltiplas considerações ou ponderações casuísticas, que só podem ser atendidas e ajustadas caso a caso. O legislador, ciente que não tem como prever todas as situações em que a Administração terá de atuar e consequentemente não conseguirá dispor acerca das melhores soluções para prosseguir o interesse público
in casu, atribui poderes discricionários ao órgão administrativo, isto é, o legislador, habilita a Administração a determinar as escolhas a fazer no caso concreto. De facto, a Administração encontra-se mais próxima dessa realidade e consegue delinear a melhor solução para o caso concreto.
Todavia, e uma vez que o poder disciplinar poderá contender com os direitos, liberdades e garantias dos trabalhados, podendo mesmo conduzir à sua restrição ou até eliminação, torna-se de extrema importância analisar o âmbito e os limites do poder discricionário no exercício do poder disciplinar, desiderato a que nos propomos no âmbito do presente trabalho.
Assim, num primeiro momento, atenta-se no instituto da discricionariedade administrativa, analisando-se a sua noção e identificando-se as formas através das quais as normas concedem ou atribuem poder discricionário à Administração.
De seguida, debruçar-nos-emos sobre o fundamento e a finalidade do poder disciplinar no vínculo de emprego público, à luz da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (doravante LGTFP).
E, num terceiro momento, propomo-nos a analisar, os momentos discricionários no exercício do poder disciplinar, isto é, se e em que medida, a Administração tem poder discricionário no âmbito da identificação da infração disciplinar e nas diversas fases do procedimento disciplinar comum.
2. Discricionariedade administrativa
2.1. Considerações preliminares: discricionariedade e vinculação
Hoje, é indiscutível que toda a atividade da Administração Pública se destina necessariamente a satisfazer e a prosseguir o interesse público. Neste sentido, podemos afirmar que o interesse público é “o norte da administração pública”
[2]. Contudo, a Administração não pode prosseguir o interesse público de forma arbitrária e, por isso, este encontra-se cerceado por um conjunto de princípios e regras. Em especial, a Administração terá de prosseguir o interesse público em observância ao bloco normativo legal, é o que se designa de princípio da juridicidade (cfr. arts. 266.º, n.º 2 da CRP e 3.º, n.º 1 do CPA).
No entanto, a verdade é que a lei não regula sempre do mesmo modo os atos a praticar pela Administração, ou seja, há diversos casos em que a lei define minuciosamente o conteúdo do agir administrativo, caso em que estaremos perante atos vinculados, uma vez que a Administração não tem qualquer poder de escolha ou margem de conformação em relação ao conteúdo do ato, havendo uma única solução possível, que resulta diretamente da lei aplicável
[3]. Pelo contrário, há casos em que lei não concretiza pormenorizadamente o conteúdo da atuação administrativa e prefere habilitar a Administração a determinar ela própria as escolhas a fazer e, nestes casos, estaremos perante atos discricionários, os quais traduzem a circunstância de a Administração determinar ou “escolher” o conteúdo dos atos, fixando o grau das modificações jurídicas pretendidas
[4].
A razão pela qual a lei admite o uso do poder discricionário parece residir no facto de o legislador reconhecer que é impossível prever antecipadamente todas as circunstâncias em que a Administração terá de atuar, com respeito pelos limites internos (competência e fim) e externos (principiologia norteadora da atividade administrativa) da discricionariedade e, além disso, reconhece que é impossível dispor acerca das melhores soluções para prosseguir o interesse público. Ora, como a Administração se encontra mais próxima dessa realidade, consegue prosseguir melhor esse fim, consegue delinear a melhor solução para o caso concreto
[5]. O mesmo é dizer que a atribuição de poderes discricionários visa permitir à Administração a descoberta da melhor solução para a satisfação do interesse público em cada caso concreto
[6].
Todavia, discricionariedade não significa arbitrariedade
[7] e, portanto, a escolha da Administração será pautada por critérios que lhe são conferidos pelos princípios e regras gerais de direito (como sejam, em particular, os princípios da proporcionalidade, da imparcialidade e da igualdade), os quais orientam a sua atuação no sentido da solução mais adequada ao caso concreto. Com efeito, só há poder discricionário quando, e na medida em que a lei o confere. Daí afirmar-se que a discricionariedade não é uma liberdade, mas sim um poder-dever jurídico
[8] ou, como refere Giannini
[9], uma
liberdade juridicamente determinada. Deste modo, a vinculação e a discricionariedade são as duas formas típicas pelas quais a lei modela a atividade da Administração Pública
[10].
2.2. Noção de discricionariedade administrativa
A discricionariedade administrativa pode ser definida como o poder conferido por uma norma de competência à Administração Pública para que esta, com base nos seus próprios juízos de apreciação e valoração, decida, em “última instância”, sobre a melhor medida a adotar numa situação em concreto
[11].
Com efeito, e como já atrás referimos, só haverá poder discricionário quando e na medida em que a lei o confere. Ora, é precisamente através das normas de competência com programação condicional que o legislador vai conferir poder discricionário à Administração, convocando-a a aplicar essas mesmas normas numa situação especifica da vida, através de uma decisão. Neste sentido, podemos afirmar que o poder discricionário tem uma fonte normativa, uma vez que resulta da autorização do poder normativo e resulta também de uma “decisão do legislador”, que manifesta a sua intenção de conferir poder discricionário à Administração através de diferentes formas, a que podemos chamar “canais de abertura discricionária”
[12].
A norma de competência vai convocar a valoração própria e suscitar juízos próprios da Administração, ou seja, a Administração vai formular juízos e valorações sobre factos, sobre a avaliação de pessoas, situações e coisas. Além disso, esta valoração pode incidir apenas na escolha da melhor medida a adotar e a aplicar ao caso concreto ou simplesmente podemos estar perante uma valoração futura (juízo de prognose) de uma determinada situação. Em suma, todos os casos indicados pressupõem desde logo que a norma de competência aplicável ao caso concreto defina um canal de abertura discricionária para que a Administração possa fazer uma valoração própria
[13] e, com fundamento nesta, a Administração vai decidir a melhor medida a adotar no caso concreto. Deste modo, o exercício do poder discricionário vai materializar-se na tomada de uma decisão e, em especial, na escolha do conteúdo ou substância dessa decisão
[14].
De resto, estamos perante uma decisão de “última instância” uma vez que só existe discricionariedade como espaço de apreciação ou valoração e de decisão próprio e reservado à Administração se esta tiver a última palavra sobre a escolha discricionária, isto é, se decidir em “última instância”
[15]. O respeito pelo tribunal do espaço de valoração ou apreciação próprio da Administração corresponde ao reconhecimento da decisão discricionária como decisão da Administração em “última instância”. Todavia, trata-se de uma decisão de “última instância” na esfera da oportunidade ou mérito
[16].
Neste sentido, o controlo jurisdicional do poder discricionário obedece apenas ao controlo da legalidade, não se estendendo à esfera da oportunidade ou mérito. Ainda assim, caberá ao tribunal, no âmbito do controlo externo, apreciar casos de “erro grosseiro, desvio de poder, erro de facto, falta de fundamentação”, e, de modo geral, de “incompatibilidade do juízo condenatório com os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e princípios fundamentais cujo cumprimento se imponha à Administração”
[17]. Não obstante, o tribunal não pode repetir a apreciação feita pela Administração, uma vez que a justificação para o facto assenta em razões de natureza substantiva, que decorrem do princípio da separação de poderes
[18].
2.3. Âmbito da discricionariedade administrativa
Como referimos anteriormente, o poder discricionário resulta de uma “decisão do legislador”, que manifesta a sua intenção de conferir poder discricionário à Administração através de várias vias, a que podemos chamar “canais de abertura discricionária”.
Neste ponto, cabe identificar esses “canais de abertura discricionária”, ou seja, vamos procurar identificar as formas através das quais a norma de competência concede ou atribui poder discricionário à Administração.
Desta forma, e como também já referimos, as normas de competência que conferem poder discricionário à Administração adotam a estrutura da programação condicional, que é constituída pela: hipótese
[19] ou previsão normativa (“se”), conector deôntico (então: “pode”) e estatuição
[20] (medida a adotar). Com efeito, a norma de competência, além de definir a competência (o órgão competente para agir), vai indicar também a finalidade ou o fim a prosseguir, o que se deduz dos pressupostos, definidos na previsão, e além disso, fornece na estatuição, uma indicação mais ao menos precisa sobre o “conteúdo” da medida a adotar
[21]. Em suma, “quem”, “quando e para quê” e “o quê”, são as indicações que se extraem da norma de competência.
Neste sentido, a competência e o fim são sempre aspetos vinculados, ou seja, em nenhum caso as aberturas discricionárias se referem ao “quem” (órgão competente), e ao “para quê” (fim de interesse público a prosseguir)
[22]. Com efeito, a discricionariedade vai residir fundamentalmente numa abertura da norma de competência sobre a indicação do “quando”, em que situações, ou de “o quê”, do conteúdo das medidas a adotar. Ora, nestes casos a norma de competência convoca uma valoração própria da Administração, autorizando-a a proferir uma decisão com fundamento naquela valoração
[23].
Em suma, a abertura discricionária pode, por um lado, residir no “quando”, encontrando-se na previsão normativa, na definição ou enunciação dos pressupostos, através da utilização de conceitos jurídicos indeterminados. E, por outro lado, pode resultar da estatuição da norma, na indicação de “o quê”, nas medidas que podem ser adotadas, ou na formulação do conector deônteco (“pode”), o elemento de ligação entre a previsão e a estatuição
[24]. De resto, a mesma norma pode até conjugar duas aberturas.
Por fim, cumpre salientar que, em bom rigor, não existem atos totalmente vinculados (a Administração tem, pelo menos, o poder de escolher o momento da prática do ato)
[25], nem atos totalmente discricionários (a competência e o fim são sempre aspetos vinculados no ato administrativo, como já atrás referimos). Daí a afirmação de que toda a atividade administrativa é um
continuum entre vinculação e discricionariedade
[26].
Vejamos então as formas através das quais a norma de competência atribui poder discricionário à Administração.
2.3.1. Conceitos indeterminados
Importa desde já sublinhar que nem todos os conceitos indeterminados conferem poder discricionário à Administração, pelo que, será necessário fazer uma distinção entre os conceitos classificatórios e os conceitos indeterminados tipo.
Neste sentido, relativamente aos conceitos classificatórios
[27], apesar de se revelarem aparentemente indeterminados ou imprecisos, é possível o respetivo preenchimento pela Administração através da interpretação jurídica
[28], quer com recurso à experiência, quer com recurso aos conhecimentos técnicos, científicos ou jurídicos. Deste modo, na interpretação e na aplicação dos conceitos classificatórios, a Administração não desenvolve um processo de valoração, nem é convocada a formular um juízo próprio
[29], razão pela qual podemos concluir que a utilização de conceitos classificatórios pela norma de competência não significa uma abertura discricionária
[30], ou seja, não atribui qualquer poder discricionário à Administração, pois conhecem apenas uma possibilidade de aplicação em cada caso.
Por conseguinte, os conceitos indeterminados tipo
[31] são suscetíveis de atribuir poder discricionário à Administração (a chamada discricionariedade de apreciação), pois são conceitos que se referem a um tipo difuso de situações da vida que não podem ser preenchidos por meio de interpretação jurídica. Demandando da Administração a condução de juízos de valor da sua própria responsabilidade
[32], apela-se já a um “preenchimento valorativo”
[33]. Todavia, referimos que os conceitos indeterminados tipo “são suscetíveis” de atribuir poder discricionário à Administração, uma vez que a circunstância de uma norma administrativa utilizar tais conceitos não significa, de
per si, que exista a intenção de conferir à Administração poder discricionário. A discricionariedade exige que se retire da norma uma intencionalidade de abertura para uma valoração própria da Administração
[34], ou seja, o preenchimento de tais conceitos tem de demandar da Administração a condução de juízos próprios, de valorações e apreciações próprias: só assim poderão ser uma fonte de discricionariedade. Neste mesmo sentido, o TCA Norte
[35] refere que os conceitos que envolvam a emissão de juízos técnicos valorativos têm o significado inequívoco de atribuição de uma margem de livre apreciação ao órgão competente.
Veja-se por exemplo, os conceitos que exigem um juízo de prognose ou de avaliação prospetiva da Administração
[36]: “inviabilidade da manutenção do vínculo de emprego público” ou “sempre que a sua presença se revele inconveniente para o serviço ou para o apuramento da verdade”, ou, ainda, os casos que obrigam à ponderação de interesses públicos complexos ou que remetem para o saber específico da Administração. Todos estes casos remetem para um espaço de valoração e apreciação próprio da Administração que se vai manifestar na decisão.
2.3.2. Permissões de ação
A norma de competência permissiva vai conferir à Administração o simples poder de decidir se vai ou não agir numa determinada situação, vai-lhe conferir a decisão de praticar ou não um certo ato
[37]: é a chamada discricionariedade de ação ou de decisão
[38].
2.3.3. Normas alternativas
Nesta situação, a norma de competência vai determinar ou indicar várias medidas possíveis que a Administração pode adotar ou escolher num dado momento, ou seja, a norma de competência vai indicar que, perante uma determinada situação, a Administração pode adotar ou escolher a medida “A, B ou C”, a que melhor se aplicar ao caso concreto.
Além disso, a norma de competência pode também estabelecer uma moldura de tempo dentro da qual a Administração pode agir. Atente-se, por exemplo, ao art. 211.º da LGTFP, que estabelece que o trabalhador pode ser preventivamente suspenso do exercício das suas funções até decisão do procedimento, mas por prazo não superior a 90 dias. Ora, neste caso a Administração pode determinar o prazo da referida suspensão dentro da fronteira dos 90 dias. É a chamada discricionariedade optativa ou de escolha
[39].
2.3.4. Não determinação das medidas a adotar
A estatuição da norma define especificamente o “poder” que a Administração vai exercer, através de uma indicação mais ao menos precisa sobre o “conteúdo” possível da decisão a adotar. Trata-se, assim, de indicar “o quê”, em que consistirá a ação administrativa
[40]. Pois bem, sucede que por vezes a norma de competência utiliza conceitos indeterminados ou cláusulas gerais na enunciação das medidas que a Administração pode adotar, definindo apenas um “conteúdo mínimo identificador” dos efeitos a produzir e investe a Administração de um efetivo poder de invenção do conteúdo da decisão administrativa
[41]. Neste sentido, o STJ
[42] refere que a norma de competência estabelece apenas o núcleo mínimo identificador do género da medida, sendo o órgão competente que densifica a atuação concreta a implementar casuisticamente. Estamos perante a chamada discricionariedade criativa.
Ora, em nossa opinião, esta forma de abertura discricionária só pode ser aceite em termos excecionais, uma vez que, como referimos, deixa à Administração a invenção do conteúdo completo do ato
[43].
3. O poder disciplinar no vínculo de emprego público
3.1. Fundamento e finalidade
Importa começar por evidenciar que, quando abordamos o poder disciplinar no vínculo de emprego público, entramos na dimensão do direito sancionatório público da entidade empregadora
[44], encontrando-se regulado na LGTFP
[45].
Neste sentido, o poder disciplinar integra os poderes hierárquicos e traduz-se na faculdade de o superior hierárquico punir o subalterno, aplicando-lhe as sanções tipificadas na lei perante a prática de infrações, isto é, por violação dos deveres funcionais
[46]. O poder disciplinar surge enquanto resposta da entidade empregadora à violação de deveres funcionais
[47].
Por conseguinte, o poder disciplinar encontra o seu fundamento no vínculo de emprego público, sendo que esta ideia resulta não só do art. 76.º da LGTFP, ao dispor que o empregador público tem poder disciplinar sobre o trabalhador ao seu serviço enquanto vigorar o vínculo de emprego público, como também do art. 176.º, n.º 3, da LGTFP, que dispõe que os trabalhadores ficam sujeitos ao poder disciplinar desde a constituição do vínculo de emprego público, em qualquer das suas modalidades. Ora, o momento da constituição do vínculo de emprego público, nas modalidades previstas no art. 6.º da LGTFP (contrato de trabalho em funções públicas, nomeação ou comissão de serviço), titulado por contrato ou ato, é o elemento fundador do poder disciplinar do emprego público
[48]. O empregador público poderá exercer o poder disciplinar sobre o trabalhador a partir da constituição daquele vínculo de emprego público e enquanto o mesmo vigorar.
Por fim, cumpre referir que o poder disciplinar, para além de ter uma finalidade sancionatória, tem também uma finalidade preventiva e corretiva, visando evitar que ocorra um novo incumprimento por parte do trabalhador
[49].
4. Discricionariedade da Administração Pública no exercício do poder disciplinar
4.1. Discricionariedade na infração disciplinar
Resulta do art. 183.º da LGTFP que se considera infração disciplinar o comportamento do trabalhador, por ação ou omissão, ainda que meramente culposo, que viole os deveres gerais ou especiais (cfr. art. 73.º da LGTFP) inerentes à função que exerce. Neste sentido, a infração disciplinar parte da verificação do incumprimento dos deveres funcionais, não sendo próprio dela a concretização de comportamentos típicos
[50] e por isso mesmo os arts. 183.º a 187.º da LGTFP fazem apenas uma enunciação exemplificativa de factos a que são aplicáveis sanções. Com efeito, consideramos que seria meramente impossível em sede disciplinar prever e enumerar um conjunto hipotético de situações que poderiam representar a violação dos deveres funcionais
[51], pois as situações são tão numerosas que uma tipificação rígida poderia impossibilitar a punição de vários comportamentos disciplinarmente relevantes
[52]. Deste modo, quer a doutrina
[53] quer a jurisprudência
[54] afirmam que a infração disciplinar é atípica e os próprios arts. 183.º a 188.º da LGTFP o confirmam. O legislador, e bem, naquelas disposições, deixou em aberto, pelo carácter exemplificativo e pela utilização de conceitos indeterminados, os comportamentos que podem conduzir à aplicação das sanções e também as descrições dos comportamentos considerados ilícitos, concedendo, assim, poderes discricionários ao órgão competente.
Neste sentido, o primeiro domínio de discricionariedade
[55] é conferido pelo legislador através da enumeração ou consagração exemplificativa (ou seja, não taxativa) dos comportamentos que podem conduzir à aplicação das sanções. Atente-se ao art. 185.º da LGTFP, que estabelece que “a sanção disciplinar de multa é aplicável a casos de negligência ou má compreensão dos deveres funcionais, nomeadamente (...)”, ou ao art. 186.º da LGTFP, que dispõe que “a sanção disciplinar de suspensão é aplicável aos trabalhadores que atuem com grave negligência, ou com grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres funcionais e àqueles cujos comportamentos atentem gravemente contra a dignidade e o prestígio da função, nomeadamente (...)”, ou ainda ao art. 187.º da LGTFP, que estabelece que “a sanção de despedimento ou de demissão são aplicáveis em caso de infração que inviabilize a manutenção do vínculo de emprego público”, sendo que esta concretização é feita no art. 297.º, n.º 3 da LGTFP, onde se estabelece que “constituem infrações disciplinares que inviabilizam a manutenção do vínculo, nomeadamente (...)”. Ora, em todos estes casos o legislador enumerou de forma exemplificativa (“nomeadamente”), e não taxativa, os comportamentos que podem conduzir à aplicação das sanções disciplinares, deixando ao órgão competente para este efeito o poder discricionário de encaixar nas previsões das normas outros comportamentos ilícitos.
Repare-se, todavia, que o art. 188.º da LGTFP não elenca situações exemplificativas dos comportamentos (o “nomeadamente”) que podem conduzir à aplicação da sanção de cessação da comissão de serviço
[56]. Logo, nestes casos, a norma não confere poder discricionário ao órgão competente.
Por sua vez, o art. 184.º da LGTFP, estabelece que “a sanção disciplinar de repreensão por escrito é aplicável a
infrações leves de serviço” (destaque nosso). Ora, também neste caso o legislador optou por não enumerar ou consagrar exemplos de comportamentos que podem conduzir à aplicação da referida sanção. Contudo, concedeu poder discricionário ao órgão competente através da utilização de conceitos indeterminados tipo
[57], que destacamos
supra, demandando do referido órgão a condução de juízos próprios e apreciações próprias (discricionariedade de apreciação), por forma a valorar que comportamentos ilícitos se encaixam na referida norma.
Por conseguinte, o segundo domínio de discricionariedade
[58] é conferido pelo legislador através da utilização de vários conceitos indeterminados tipo ao longo dos arts. 184.º a 187.º da LGTFP, que exigem a condução de juízos de valor e juízos de prognose ou de avaliação prospetiva, permitindo ao órgão competente para o efeito a discrição dos comportamentos considerados ilícitos. Atente-se, por exemplo, para além do caso que referimos
supra, aos seguintes conceitos: “sem consequência importantes”, “grave negligência”, “desobedeçam escandalosamente”, “desrespeitem gravemente”, “grave desinteresse”, “inviabilize a manutenção do vínculo de emprego público”, “atos manifestamente ofensivos”, entre outros.
Consideramos, no entanto, que nesta matéria, a Administração tem um especial dever de fundamentação
[59], isto é, tem o especial dever de descrever os factos ou as condutas que corporizam a violação deste ou daquele dever, pois é através desta fundamentação que se afere a legalidade da sua decisão.
Face ao exposto, acompanhamos o pensamento de Raquel Carvalho
[60] e Vasco Cavaleiro
[61], quando sustentam que a formulação discricionária e não taxativa das infrações disciplinares não se traduz na existência de arbítrio nem isenta a Administração da estrita observância dos Direito Fundamentais, pois discricionariedade ainda á legalidade. Tal como tivemos oportunidade de referir anteriormente a escolha da Administração será pautada por critérios que lhe são conferidos pelos princípios e regras gerais de direito (como sejam, os princípios da proporcionalidade, da imparcialidade e da igualdade), os quais orientam a sua atuação no sentido da solução mais adequada ao caso concreto.
Resta salientar que, contrariamente ao que sucede com as infrações disciplinares, as sanções disciplinares estão sujeitas ao princípio da tipicidade, ou seja, a LGTFP apresenta um catálogo taxativo de sanções disciplinar, pelo que, aos comportamentos ilícitos dos trabalhadores só poderão ser aplicadas as sanções tipificadas naquele diploma, isto é, repreensão por escrito (art. 184.º da LGTFP), multa (art. 185.º da LGTFP), suspensão (art. 186.º da LGTFP), despedimento disciplinar ou demissão (187.º da LGTFP) e cessação da comissão de serviço (art. 188.º da LGTFP), cfr. arts. 180.º e 181.º da LGTFP.
4.2. Discricionariedade no procedimento disciplinar comum
O procedimento disciplinar corresponde a um conjunto de atos, formalidades e garantias articulados que se ordenam ao apuramento da prática de infrações disciplinares e à correspondente decisão sobre a aplicação de uma sanção disciplinar
[62]. Neste sentido, o procedimento disciplinar pode ser comum, aplicando-se em todos os casos a que não corresponda processo especial, ou pode ser especial, aplicando-se aos casos expressamente previstos na lei (processo de inquérito e sindicância e processo de averiguação) (cfr. art. 195.º, n.
os 1 e 2 da LGTFP). Ora, no nosso trabalho vamos apenas debruçar-nos sobre o procedimento disciplinar comum, regulado nos arts. 205.º a 231.º da LGTFP.
Dito isto, importa agora observar e analisar as várias fases do procedimento disciplinar comum e perceber se a Administração possui ou não discricionariedade ao longo das referidas fases.
4.3. Na instauração do procedimento disciplinar
Embora a lei não identifique expressamente esta fase como a fase da iniciativa, podemos identificá-la como tal, uma vez que é a partir desta fase que se dá início ao procedimento disciplinar. Neste sentido, o procedimento disciplinar ocorre por iniciativa de um órgão administrativo, na sequência ou não de uma participação ou queixa (cfr. art. 206.º da LGTFP) de que um trabalhador cometeu uma infração disciplinar. Com efeito, assim que seja recebida a participação ou a queixa, a entidade competente (cfr. art. 196.º da LGTFP, ou seja, qualquer superior hierárquico) para instaurar o procedimento disciplinar, decide se a ele deve ou não haver lugar, por conseguinte, se entender que não há lugar a procedimento disciplinar manda arquivar a participação ou a queixa, caso contrário instaura o procedimento disciplinar (cfr. art. 207.º da LGTFP).
Ora, a questão que mormente se levanta e que importa aqui dilucidar em primeiro lugar é saber se o art. 207.º da LGTFP concede discricionariedade ao órgão competente para decidir se instaura ou não o procedimento disciplinar. Neste sentido, em nosso entender, o superior hierárquico tem o poder discricionário, de avaliação, se haverá ou não lugar à instauração do procedimento disciplinar
[63], ou seja, existe um espaço de discricionariedade para uma primeira averiguação por forma a perceber se os factos que lhe foram apresentados relevam ou não em sede disciplinar
[64], sendo que esta tese encontra respaldo normativo expresso no já citado art. 207.º, n.º 1 da LGTFP, que dispõe que “assim que seja recebida a participação ou queixa, a entidade competente para instaurar o procedimento disciplinar
decide se a ele deve ou não haver lugar” (destaque nosso). Ora, ao decompor o preceito resulta: previsão: “assim que seja recebida a participação ou queixa”; estatuição: “a entidade competente para instaurar o procedimento disciplinar”; operador deôntico: “decide”; primeiro segmento: instaurar o procedimento (“deve haver lugar”); ou segundo segmento: não instaurar o procedimento (“não deve haver lugar”).
Do exposto, podemos claramente afirmar que a norma concede discricionariedade ao órgão competente, isto é, concede-lhe espaço de apreciação ou conformação para uma primeira averiguação ou apuramento dos factos por forma a perceber se os mesmo indiciam o cometimento de uma infração disciplinar
[65], para decidir se instaura ou não o correspondente procedimento disciplinar (optando pela alternativa que se lhe oferece). Assim, caso entenda que os factos apresentados não configuram matéria suficiente ou relevante para o procedimento disciplinar, manda arquivar, caso contrário instaura o procedimento disciplinar, sempre acompanhado da devida fundamentação. Tem sido este o entendimento uniforme ao nível da jurisprudência
[66] e também da doutrina
[67], temos aqui a chamada discricionariedade de ação ou decisão.
Por conseguinte, questão diferente é perceber o âmbito de tal discricionariedade, ou seja, perceber se depois de indiciada a prática de uma infração disciplinar, existe para o órgão competente o dever de instaurar o procedimento disciplinar ou se a instauração desse procedimento está no poder discricionário do referido órgão? E aqui, entendemos que se o órgão competente verificar que os factos indiciam a existência de uma infração disciplinar, então ele tem o dever
[68] de instaurar o procedimento disciplinar, o que não significa, de per si, que culmine na aplicação de uma sanção disciplinar, visto que existem outras fases procedimentais com vista à averiguação dos factos que conduzem concretamente à decisão. Contudo, esta posição não é tão linear, pois na jurisprudência encontramos vários acórdãos
[69] que sustentam que mesmo que se verifique o cometimento de uma infração disciplinar o órgão competente não está,
de per si, obrigado a instaurar o procedimento disciplinar, argumentando que aquele órgão goza de poderes discricionários que se norteiam pelos princípios da oportunidade e da conveniência. Ora, discordamos de tal posição, uma vez que consideramos que o poder disciplinar não constitui um direito subjetivo do órgão competente, para que perante o indício claro de uma infração disciplinar decida, por razões de oportunidade ou conveniência (seja de que natureza for) não instaurar o procedimento disciplinar, estamos sim perante um poder-dever jurídico
[70].
Assim, parece-nos razoável afirmar, como aliás já referimos, que o órgão competente tem poder discricionário para fazer uma primeira averiguação ou apuramento dos factos por forma a perceber se os mesmos indiciam ou não o cometimento de uma infração disciplinar, mas já não nos parece razoável que se enquadre nos limites da norma do art. 207.º da LGTFP a situação em que, havendo indícios claros da prática de uma infração disciplinar, o órgão competente tenha poder para decidir, optar por arquivar o procedimento, podendo aqui gerar-se muitas dúvidas acerca das suas motivações e ,além disso, não existem critério que permita diferenciar quando é que seria legitimo instaurar ou não o procedimento disciplinar pelos mesmos factos a trabalhadores diferentes. Deste modo, parece-nos que esta ideia também é reforçada no art. 188.º, n.º 1, al.a) da LGTFP ao dispor que ficam sujeitos à aplicação de uma sanção disciplinar os dirigentes e equiparados que não procedam disciplinarmente contra os trabalhadores seus subordinados pelas infrações de que tenham conhecimento.
4.4. Na fase da instrução
Instaurado o procedimento disciplinar, segue-se a fase da instrução, na qual o órgão competente nomeia o instrutor (cfr. art. 208.º da LGTFP), que tem a especial “missão” de realizar o procedimento disciplinar, desde a sua instauração até à decisão final. Nesta fase, o instrutor deve averiguar e apurar os factos relevantes, através da realização de diligências necessárias e pertinentes, em ordem a uma justa e rápida decisão do procedimento
[71]. A fase da instrução é largamente dominada pelo princípio do inquisitório (cfr. art. 58.º do CPA) e do contraditório
[72].
Neste sentido, analisando o art. 212.º da LGTFP, que estabelece algumas regras sobre a fase da instrução, verificamos, desde logo, que este preceito concede alguns poderes discricionários do instrutor. Assim, do n.º 2 do referido preceito, resulta que o instrutor sempre que entender conveniente, ouve o trabalhador (audição do trabalhador), e pode também acareá-lo, com as testemunhas ou o participante. Ora, no primeiro caso a norma confere poder discricionário através da utilização de conceitos indeterminados tipo “
sempre que entender conveniente”, que vão demandar do instrutor a condução de juízos próprios, de valorações e apreciações próprias (discricionariedade de apreciação), ouvindo o trabalhador sempre que isso se revele necessário para a descoberta da verdade e no segundo caso a discricionariedade resulta do uso da palavra “
pode”, norma autorizava ou permissiva e, portanto, pode ou não acareá-lo (destaque nosso).
Por conseguinte, o princípio do contraditório, concede ao trabalhador a possibilidade de requerer ao instrutor que promova as diligências para que tenha competência e consideradas por aquele essências para o apuramento da verdade (cfr. art. 212.º, n.º 3 da LGTFP), todavia, o n.º 4 do referido preceito, concede ao instrutor poder discricionário, para indeferir tais diligências, em despacho fundamentado, “
quando julgue suficiente a prova produzida” (destaque nosso). Com efeito, verificamos que a norma concede poder discricionário ao instrutor através da utilização de conceitos indeterminados tipo, que destacamos
supra, exigindo do instrutor um espaço de valoração e apreciação própria de que as provas que tem em seu poder são suficientes para o apuramento da verdade dos factos e que por isso as diligências requeridas não relevam à instrução, isto é, já tem em seu poder todos os factos relevantes para o conhecimento pleno da situação (discricionariedade de apreciação). No entanto, uma vez que esta decisão poderá, no limite, pôr em causa ou prejudicar o direito de defesa do trabalhador, o instrutor deverá fundamentar
[73] exaustivamente a sua decisão de indeferimento
[74], que está balizado pelo limite do apuramento da verdade.
Consideramos que esta discricionariedade é bastante relevante, uma vez que era meramente impossível ao legislador prever quando é que o instrutor já teria prova suficiente para avaliar os factos: esta ponderação só é possível caso a caso.
Concluídas todas as diligências, se o instrutor entender que os factos constantes dos autos não constituem infração disciplinar, elabora a proposta de arquivamento
[75]. Caso contrário deduz acusação e notifica o órgão que mandou instaurar o procedimento e o trabalhador (cfr. art. 213.º da LGTFP).
Sucede que, ainda durante esta fase, o trabalhador pode ser suspenso preventivamente do exercício das suas funções (cfr. art. 211.º da LGTFP). Trata-se de uma medida cautelar instrumental. Neste sentido, o n.º 1 do art. 211.º da LGTFP refere que o trabalhador pode, sob proposta da entidade que tenha instaurado o procedimento disciplinar ou do instrutor, e mediante despacho do dirigente máximo do órgão ou serviço, ser preventivamente suspenso do exercício das suas funções, sem perda da remuneração base, até decisão do procedimento, mas por prazo não superior a 90 dias, sempre que a sua presença se revele inconveniente para o serviço ou para o apuramento da verdade, sendo que esta suspensão só pode ter lugar em caso de infração punível com sanção disciplinar de suspensão ou superior (cfr. arts. 211.º, n.º 2, 186.º e 187.º da LGTFP).
Ora, neste caso a norma confere, numa primeira etapa, poder discricionário à entidade que instaurou o procedimento disciplinar e ao instrutor, que têm a iniciativa de propor tal suspensão. E, numa segunda etapa, confere poder discricionário ao dirigente máximo do órgão ou serviço, entidade que decide, inicialmente através do uso da palavra “
pode”, norma autorizava ou permissiva e de seguida através da utilização de conceitos indeterminados tipo “
sempre que a sua presença se revele inconveniente para o serviço ou para o apuramento da verdade” (destaque nosso), que vão demandar ou exigir das entidades referidas um juízo de prognose ou de avaliação e valoração prospetiva (discricionariedade de apreciação), tendo que comprovar e fundamentar
[76] que a presença do trabalhador é inconveniente e intolerável para o serviço ou para o apuramento da verdade, nomeadamente porque poderia influenciar o curso da investigação, seja pressionando as testemunhas, seja destruindo/subtraindo documentos ou porque a sua confiança está abalada e isso terá reflexo no prestígio do próprio serviço
[77]. E por fim, as entidades gozam de discricionariedade na determinação do prazo da referida suspensão, que não pode ultrapassar a fronteira dos 90 dias (discricionariedade de escolha).
4.5. Na fase de defesa do trabalhador
Da acusação deduzida pelo instrutor extrai-se uma cópia para ser entregue ao trabalhador, para que este possa apresentar a sua defesa por escrito (cfr. art. 214.º da LGTFP). Repare-se que a acusação é a pedra de toque de defesa do trabalhador, o pilar do contraditório
[78]. É o momento do confronto do trabalhador com a realidade daquilo que lhe é imputado e, por isso mesmo, a acusação tem de ser clara, elencando de forma precisa todos os factos.
Deste modo, o trabalhador apresenta a sua defesa, podendo para esse efeito apresentar o rol de testemunhas, juntar documentos e requerer a realização de quaisquer diligências (cfr. art. 216.º, n.º 6 da LGTFP). Todavia, o n.º 1 do art. 218.º da LGTFP concede ao instrutor poder discricionário, para recusar tais diligências, em despacho fundamentado, “
quando sejam manifestamente impertinentes e desnecessárias” (destaque nosso). Neste sentido, verificamos que a norma confere poder discricionário ao instrutor através da utilização de conceitos indeterminados tipo, identificados acima, demandando do instrutor a condução de juízos próprios e de apreciações próprias (discricionariedade de apreciação), para decidir se as diligencias requeridas são ou não manifestamente desnecessárias e, por conseguinte, se as recusa ou não. Com efeito, este caso é semelhante àquele que identificamos na fase de instrução, só que naquele caso a recusa tinha por base o entendimento de que a prova produzida era suficiente, ao passo que, neste caso, a recusa tem por base o entendimento que as diligencias requeridas pelo trabalhador são manifestamente impertinentes e desnecessárias. Significa isto que o instrutor não tem de realizar as diligências irrelevantes ou dispensáveis do ponto de vista da produção de prova, designadamente porque se destinam a provar factos relativamente aos quais já não subsistem quaisquer dúvidas, podendo igualmente o instrutor recusar a realização de diligências notoriamente desproporcionais ou sem qualquer relação com o objeto do processo
[79]. Por conseguinte, resulta do n.º 3 do art. 218.º da LGTFP que o instrutor
pode recusar a inquirição de testemunhas quando
considere suficientemente provados os factos alegados pelo trabalhador (destaque nosso). Ora, a norma confere poder discricionário ao instrutor através do uso da palavra “pode”, norma autorizava ou permissiva, e da utilização de conceitos indeterminados tipo, que destacamos
supra, e, portanto, sempre que considere que os factos alegados pelo trabalhador já estão provados, pode recusar a inquirição de testemunhas, evitando que sejam praticados atos inúteis e desnecessário. Por conseguinte, ambas as recusas deverão ser devidamente fundamentadas, demonstrando as razões e motivações que o levaram a decidir de tal forma
[80].
Por fim, e uma vez que o art. 218.º da LGTFP está dirigido a concretizar o princípio do inquisitório e a descoberta da verdade
[81], o seu n.º 9 concede ainda poderes discricionários ao instrutor, para ordenar a realização de novas diligências, finda a produção da prova oferecida pelo trabalhador, desde que essas “
diligências sejam indispensáveis para o completo esclarecimento da verdade” (destaque nosso). Ora, a norma confere poderes discricionários ao instrutor através da utilização de conceitos indeterminados tipo, que exigem do instrutor um juízo de valoração próprio (discricionariedade de apreciação), no sentido de perceber se a prova que tem em seu poder é ou não suficiente para o completo esclarecimento da verdade. O instrutor tem a especial missão, ou o dever, de averiguar e apurar os factos relevantes, em ordem a uma justa e rápida decisão do procedimento, em ordem à descoberta da verdade, e, por isso mesmo, consideramos que a realização de novas diligências não pode servir para “contrariar“ a prova apresentada pelo trabalhador, nem para “completar” uma instrução insuficiente, mas deve sim limitar-se aos factos relativamente aos quais a prova produzida não foi suficiente para permitir ao instrutor formar a sua convicção
[82].
4.6. Na fase de decisão
Finda a fase de defesa do trabalhador, o instrutor elabora, no prazo de 5 dias, o relatório final completo e conciso donde constem a existência material das faltas, a sua qualificação e gravidade, importâncias que porventura haja a repor e seu destino, bem como a sanção disciplinar que entenda justa (cfr. art. 219.º, n.º 1 da LGTFP). Sendo que a entidade competente para decidir
pode, se a complexidade do processo assim o exigir, prorrogar aquele prazo,
até ao limite máximo de 20 dias (destaque nosso). Com efeito, verificamos que a norma confere poder discricionário à entidade competente para decidir se prorroga ou não o prazo para elaboração do relatório final, através do uso da palavra “pode”, norma autorizava ou permissiva, e também para fixar tal prazo, dentro da fronteira inultrapassável dos 20 dias (discricionariedade de escolha).
Por conseguinte, o relatório final é remetido à entidade competente, que analisa o processo e decide se concorda ou não com as conclusões do relatório final, mas a sua decisão terá sempre de ser fundamentada
[83] (cfr. art. 220.º, n.
os 1 e 4 da LGTFP). Todavia, os n.
os 1 e 2 do art. 220.º da LGTFP estabelecem que, antes da decisão, a entidade competente
pode ordenar a realização de novas diligências e
pode solicitar ou determinar a emissão de parecer por parte do superior hierárquico do trabalhador ou de unidades orgânicas do órgão ou serviço a que o mesmo pertença (destaque nosso). Ora, estas normas conferem poder discricionário à entidade competente para decidir se requer ou não a realização de novas diligências e a emissão do parecer, através do uso da palavra “pode”, norma autorizava ou permissiva.
Por fim, a decisão é notificada ao trabalhador, começando a produzir os seus efeitos no dia seguinte à notificação ou, caso a mesma não seja possível, 15 dias após a publicação de aviso na 2.ª série do Diário da República (cfr. arts. 222.º e 223.º da LGTFP).
5. Conclusão
A discricionariedade não é um “mal necessário” que deva ser reduzido ao mínimo possível, mas, antes pelo contrário, desempenha um papel positivo, quer na realização do interesse público, quer na proteção dos direitos fundamentais
[84].
Com efeito, discricionariedade não significa arbitrariedade: repare-se que só haverá discricionariedade quando e na medida em que a lei a confere e, além disso, a escolha da Administração será sempre pautada por critérios que lhe são conferidos pelos princípios e regras gerais de direito (como seja, em particular, os princípios da igualdade, imparcialidade e proporcionalidade), os quais orientam a sua atuação no sentido da solução mais adequada ao caso concreto.
A discricionariedade administrativa está presente em todos os ramos de Direito Administrativo e o universo do poder disciplinar não é exceção.
Neste sentido, no que toca à infração disciplinar, o primeiro domínio de discricionariedade é conferido pelo legislador, nos arts. 185.º a 187.º da LGTFP, através da enumeração exemplificativa (ou seja, não taxativa) dos comportamentos que podem conduzir à aplicação das sanções disciplinares, deixando, deste modo, ao órgão competente o poder discricionário de encaixar nas previsões das normas outros comportamentos ilícitos. Já o segundo domínio de discricionariedade resulta da utilização de vários conceitos indeterminados tipo ao longo dos arts. 183.º a 187.º da LGTFP, que permitem ao órgão competente a discrição dos comportamentos considerados ilícitos.
Já no que respeita à instauração do procedimento disciplinar, entendemos que que o órgão competente tem poder discricionário para realizar uma primeira averiguação dos factos por forma a perceber se os mesmos indiciam ou não o cometimento de uma infração disciplinar e, por conseguinte, decidir se instaura ou não o procedimento. Todavia, se verificar que os factos indiciam a existência de uma infração disciplinar, ele tem o dever de instaurar o procedimento disciplinar. Neste sentido, consideramos que o poder disciplinar não constitui um direito subjetivo do órgão competente, para que, perante o indício claro de uma infração disciplinar, decida, por razões de oportunidade ou conveniência (seja de que natureza for), não instaurar o procedimento disciplinar. Estamos sim perante um poder-dever jurídico.
Por conseguinte, na frase de instrução, o instrutor tem poderes discricionários na sua gestão, seja ao nível da realização das diligências necessárias ou que entenda convenientes para a descoberta da verdade, seja na suspensão preventiva do trabalhador, que só pode ter lugar em caso de infração punível com sanção disciplinar de suspensão ou superior.
Na fase de defesa do trabalhador, o instrutor tem poderes discricionários para recusar a realização das diligências requeridas pelo trabalhador, sempre que estas sejam manifestamente impertinentes e desnecessárias. E, além disso, pode recusar a inquirição de testemunhas e ordenar a realização de novas diligências que sejam indispensáveis para o completo esclarecimento da verdade.
Já na fase de decisão, a entidade competente para decidir tem poderes discricionários ao nível da fixação do prazo para a entrega do relatório final (dentro do limite dos 20 dias estabelecidos na norma) e, além disso, pode ainda ordenar a realização de novas diligências e solicitar a emissão de um parecer.
Entendemos, porém, que no exercício do poder disciplinar, o órgão administrativo tem uma especial obrigação de fundamentação, principalmente quando atua no âmbito de podes discricionários, pois é através da fundamentação que se afere a legalidade da decisão administrativa. E, além disso, verificamos que os problemas mais controversos se levantam no âmbito da infração disciplinar e na instauração do procedimento disciplinar.
Por fim, resta salientar que discricionariedade no exercício do poder disciplinar é bastante relevante, uma vez que seria meramente impossível ao legislador prever todas as situações em que a Administração vai ter de atuar e consequentemente também não lhe era possível dispor acerca das melhores soluções para prosseguir o interesse público, pois uma vinculação rígida tornaria o sistema ineficaz.
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(Disponíveis em: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/home.html)
Ac. do STA, de 08.06.2000 (Oliveira Abreu), processo n.º 41879
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Ac. do STJ, de 23.09.2020 (Nuno Gomes Da Silva), processo n.º 44/19.9YFLSB
Ac. do STJ, de 16.12.2020 (Francisco Caetano), processo n.º 11/20.0YFLSB
Ac. do STJ, de 24.02.2021 (Oliveira Abreu), processo n.º 8/20.0YFLSB
Ac. do TCA Norte, de 02.06.2023 (Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão), processo n.º 00404/22.8BECBR
(Disponíveis em: https://www.dgsi.pt)
[1] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, 3.ª Edição, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2022, p. 106.
[2] Diogo Freitas Do Amaral,
Curso de Direito Administrativo, Vol. II., 3.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2016, p. 38.
[3] Fernanda Paula Oliveira, José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, 4.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2016, p. 124.
[4] Fernanda Paula Oliveira, José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, cit., p. 125.
[5] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, Vol.1, Coimbra, Almedina, 2019, p. 217.
[6] Mário Aroso De Almeida,
Teoria Geral do Direito Administrativo, 3.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2016, p. 312.
[7] Marcello Caetano refere que o poder discricionário significa livre dentro dos limites permitidos pela realização de certo fim visado pela lei, por isso acentua constantemente que o poder discricionário não é arbítrio. Marcello Caetano,
Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, Edições Almedina, 2010, p. 131. Diogo Freitas Do Amaral,
Curso de Direito Administrativo, cit., p. 72.
[8] Diogo Freitas Do Amaral,
Curso de Direito Administrativo, cit., p. 72.
[9] Massimo Severo Giannini,
Derecho Administrativo, Olejnik Ediciones, 2023, pp. 92-93.
[10] Veja-se que o Ac. do STA, de 21.06.2011 (Pires Esteves), processo n.º 011/11, refere mesmo que a Administração pode atuar no exercício de poderes vinculados e no exercício de poderes discricionários. O poder é vinculado quando a lei não remete para o critério do respetivo titular a escolha da solução concreta mais adequada e é discricionário quando o seu exercício fica entregue ao critério do respetivo titular. Disponível em:
https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a4b5e327c0c9df58802578bc003b6629?OpenDocument (27.09.2023).
[11] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., pp. 218-224.
[12] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 219.
[13] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 221.
[14] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 223.
[15] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 232.
[16] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 232.
[17] Neste sentido, vide Ac. do STA, de 31.10.2019 (José Veloso), processo n.º 0714/18.9BALSB, disponível em: https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7d483d201ff1aabb802584aa00405b26?OpenDocument&ExpandSection=1 (28.09.2023).
[19] A hipótese contém uma descrição típica de uma situação da vida.
[20] A estatuição indica o conteúdo da intervenção da Administração, ou seja, define aquilo que a Administração pode ou deve fazer em face da situação verificada.
[21] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 201.
[22] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 251.
[23] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 252.
[24] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 252.
[25] Diogo Freitas Do Amaral,
Curso de Direito Administrativo, cit., p. 69.
[26] Fernanda Paula Oliveira / José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, cit., p. 125
[27] Veja-se a título de exemplos alguns conceitos desta natureza: “período noturno”, “robustez física”, etc.
[28] Fernanda Paula Oliveira / José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, cit., p. 132.
[29] Vieira de Andrade refere que nos conceitos classificatórios não existe uma verdadeira indeterminação e que por isso se resolvem por via interpretativa. José Vieira De Andrade,
Lições de Direito Administrativo, 5.º Edição, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2017, p. 57.
[30] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 255.
[31] Veja-se a título de exemplos alguns conceitos desta natureza: “infração leve de serviço”, “grave desinteresse”, “desobedeçam escandalosamente”, etc.
[32] Fernanda Paula Oliveira / José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, cit., p. 132.
[33] Diogo Freitas Do Amaral,
Curso de Direito Administrativo, cit., pp. 95-96.
[34] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 256.
[36] Fernanda Paula Oliveira / José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, cit., p. 133.
[37] Diogo Freitas Do Amaral,
Curso de Direito Administrativo, cit., p. 81.
[38] Neste mesmo sentido, Sérvulo Correia refere que a discricionariedade de decisão consiste em deixar ao órgão titular do poder a decisão sobre se determinados efeitos preditos, mas não impostos pela norma serão ou não produzidos no caso concreto. José Manuel Sérvulo Correia,
Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativo, Coimbra, Almedina, 1986. p. 479.
[39] Neste sentido, Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., pp. 262-264; Fernanda Paula Oliveira, José Eduardo Figueiredo Dias,
Noções Fundamentais de Direito Administrativo, cit., p. 128; e José Vieira De Andrade,
Lições de Direito Administrativo, cit., p. 56.
[40] Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 264.
[41] Neste sentido, Bernardo Diniz de Ayala refere que a norma estabelece apenas o núcleo mínimo identificado do género da medida, sendo o órgão competente que densifica a atuação concreta a implementar casuisticamente. Bernardo Diniz Ayala,
O (Défice de Controlo) Judicial da Margem de Livre Decisão Administrativa, Lisboa, Lex- Edições Jurídica, 1995., pp. 107-108.
[43] José Manuel Sérvulo Correia,
Legalidade e Autonomia Contratual..., cit., p. 479.
[44] Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa do Trabalhador em Funções Públicas, Coimbra, Almedina, 2021, p. 19.
[45] Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho.
[46] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 106.
[47] J. M. Nogueira Da Costa,
O Poder Disciplinar na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas: Comentário da LGTFP, Coimbra, Almedina, 2021., p. 154.
[48] Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa..., cit., p. 23.
[50] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 203.
[51] Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa..., cit., 42.
[52] Importa porém evidenciar que, apesar da proximidade funcional entre o direito penal e o direito disciplinar, ao contrário do que sucede no domínio penal, em que vigora o princípio da tipicidade, no direito disciplinar não existe uma tipificação densificada e exaustiva do que pode ser qualificado e punido como infração, isto é, a “infração disciplinar assume-se como uma infração atípica, sendo esta justamente uma das características que a distingue do ilícito criminal” (vide o Ac. do STJ, de 16.12.2020 (Francisco Caetano), processo n.º 11/20.0YFLSB, disponível em:
http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ed3138944b30cdb88025867100530ba0?OpenDocument (10.12.2023) e Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa..., cit., p. 40). Neste sentido e de acordo com o Tribunal Constitucional “o grau de formalização legal constitucional exigido ao direito disciplinar é sempre menor do que aquele que é requerido ao direito criminal” (Ac. n.º 229/2012 (Catarina Sarmento e Castro), processo n.º 82/10, de 12.05.2012, disponível em:
https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20120229.html (10.12.2023)), sublinhando o mesmo Tribunal que “a caracterização do ilícito disciplinar, de modo a desejavelmente poder abranger uma multiplicidade de condutas censuráveis, exige, por vezes, o uso de conceitos indeterminados na definição do tipo”, sendo importante que a norma contenha “critérios de decisão para a aplicação da sanção” (Ac. n.º 384/2003 (Maria Helena Brito), processo n.º 40/03, de 15.07.2003, disponível em:
https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20030384.html (12.12.2023).
Todavia, este entendimento não foi sempre tão linear, pois, a verdade é que em tempos o Tribunal Constitucional proferiu algumas decisões em que sustentava a inconstitucionalidade das formulações disciplinares discricionárias (
hoc sensu, vide Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 204, Ac. n.º 666/94 (Messias Bento), processo n.º 307/91,de 14/12/1994e Ac. n.º 91/01, (Messias Bento), processo n.º 532/2000, de 13.03.2001, disponíveis em: https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19940666.html (12.12.2023) ; https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20010091.html (12.12.2023).
[53] Neste sentido, vide Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa..., cit., p. 40; Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 203 e J.M Nogueira da Costa,
O Poder Disciplinar na Lei Geral do Trabalho..., cit., p. 267.
[55] Raquel Carvalho,
“Poder disciplinar, discricionariedade e controlo judicial
”, in
Caderno de Justiça Administrativa, n.º 130, Braga, Centro de Estudos Jurídicos do Minho, 2018, p. 60.
[56] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 225.
[57] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 60.
[58] Raquel Carvalho,
“Poder disciplinar, discricionariedade e controlo judicial
” ..., cit., p. 60.
[60] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 204.
[61] Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa..., cit., p. 40.
[62] Ana Fernanda Neves
, O Direito Disciplinar na Função Pública, Vol. II, Lisboa, Tese de Doutoramento: Universidade de Lisboa, 2007, p. 297.
[63] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 291.
[64] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 252.
[65] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 252.
[66] Veja-se a título de exemplo: Ac. do STA, de 08.06.2000 (Oliveira Abreu), processo n.º 41879, citado no Ac. do STJ, de 24/02/2021 (Oliveira Abreu), processo n.º 8/20.0YFLSB, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2ebbb4dc19f0fa2980258688002d623a?OpenDocument&Highlight=0,fevereiro (09.10.2023); Ac. do TCA do Norte, 28.02.2020 (Helena Ribeiro), processo n.º 00076/10.2BEVIS, disponível em:
https://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/1415e8b368e78bd980258527004da33a?OpenDocument e AC. do STA de 08/11/2012, processo n.º 896/12 (09.10.2023).
[67] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., pp. 252-292; Marcello Caetano,
Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, cit., pp. 836-837 e Pedro Costa Gonçalves,
Manual de Direito Administrativo, cit., p. 263.
[68] Neste sentido, J. M. Nogueira Da Costa,
O Poder Disciplinar na Lei Geral do Trabalho..., cit., p. 403 e Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 252.
[70] Raquel Carvalho
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 252 e Vasco Cavaleiro,
O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa..., cit., p. 38.
[71] Ana Fernanda Neves,
O Direito Disciplinar na Função Pública, cit., p. 370.
[72] Raquel Carvalho,
“Poder disciplinar, discricionariedade e controlo judicial
” ..., cit., p. 64.
[74] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 305.
[75] Uma vez que o poder punitivo pertence à entidade competente para decidir e não ao instrutor, consideramos que aquela entidade pode decidir de forma contrária à proposta de arquivamento.
[76] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., pp. 300-301.
[77] Veja-se por exemplo, o caso do trabalhador que lida com dinheiro dos contribuintes e é mantido ao serviço depois de ter desviado quantias em proveito próprio.
[78] Ana Fernanda Neves,
O Direito Disciplinar na Função Pública, cit., p. 391.
[80] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 321.
[81] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 321.
[82] J. M. Nogueira Da Costa,
O Poder Disciplinar na Lei Geral do Trabalho..., cit., p. 474.
[83] Raquel Carvalho,
Comentário ao Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas..., cit., p. 325. Ao longo do presente trabalho salientamos diversas vezes a importância da fundamentação.
[84] José Vieira De Andrade,
Lições de Direito Administrativo, cit., p. 61.