ANO 2016 N.º 1
ISSN 2182-9845
Teresa Moura dos Santos
Cláusulas contratuais gerais; contratos de adesão; práticas comerciais desleais; ação enganosa; omissão enganosa.
O objetivo do presente estudo consiste em propor uma ligação entre as disposições da Diretiva 93/13/CEE – Diretiva relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com consumidores –, e as da Diretiva 2005/29/CE – Diretiva relativa às práticas comerciais desleais das empresas face aos consumidores –, e averiguar, por conseguinte, quais as consequências dessa coordenação ao nível do direito interno português. Pretende-se, assim, avaliar as circunstâncias concretas em que a utilização de uma cláusula contratual geral, incluída num contrato de adesão, se configura como uma prática comercial desleal.
Para o efeito, começa-se por abordar o fenómeno da contratação em massa – suas caraterísticas e problemáticas –, e das práticas comerciais desleais, indicando-se quais os diplomas que tutelam o consumidor, neste âmbito.
Num segundo momento, qualifica-se o uso de cláusulas contratuais gerais, presentes em contratos de adesão, como uma prática comercial.
De seguida, é sustentado que o uso de cláusulas contratuais gerais abusivas, no sentido da Diretiva 93/13/CEE, implica, frequentemente, os elementos constitutivos de uma prática comercial desleal business-to-consumer, para efeitos da Diretiva 2005/29/CE, nomeadamente uma ação enganosa, uma vez que tal equivalerá ao fornecimento de informação falsa e é capaz de distorcer o comportamento económico do consumidor médio no que diz respeito quer à decisão de contratar, quer durante a execução do negócio jurídico, em relação aos direitos e obrigações emergentes do mesmo, uma vez que no texto contratual se encontram cláusulas abusivas que são, por conseguinte, não vinculativas para o consumidor. Ademais, é defendido que a utilização, pelos profissionais, de cláusulas contratuais gerais não transparentes é proibida, de acordo com a Diretiva 93/13/CEE, e nos casos em que a falta de transparência recai sobre informações substanciais (definidas pela Diretiva 2005/29/CE), tal prática deve ser considerada uma prática comercial desleal, mais concretamente uma omissão enganosa. Salienta-se a análise do Acórdão Perenicová e Perenic, pioneiro na conexão entre as diretivas.
Por fim, demonstra-se que não existe qualquer conflito entre as disposições da Diretiva 93/13/CEE e as disposições da Diretiva 2005/29/CE. Conclui-se, advogando que os tribunais portugueses devem garantir uma aplicação complementar dos diplomas que realizaram a transposição das diretivas em causa (o Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, e o Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de março) sempre que o uso de uma cláusula contratual geral, inserida num contrato de adesão, se configure como uma prática comercial desleal.
1. Introdução
2. A utilização de contratos de adesão e de cláusulas contratuais gerais enquanto prática comercial dos profissionais face aos consumidores
3. As situações em que o uso de cláusulas contratuais gerais num contrato de adesão configura uma prática comercial desleal
3.1. A utilização de cláusulas contratuais gerais abusivas enquanto prática comercial desleal
3.2. A intransparência das cláusulas contratuais gerais: uma proibição específica
3.3. O Acórdão Perenicová e Perenic, do Tribunal de Justiça da União Europeia
a) Matéria de facto, processo principal e questões prejudiciais
b) Conclusões da Advogada-Geral
i. Observações preliminares
ii. Primeira questão prejudicial: o impacto das cláusulas abusivas na validade do contrato como um todo
iii. Segunda questão prejudicial: a relação entre a Diretiva 2005/29/CE e a Diretiva 93/13/CEE
c) Decisão
4. A necessidade de coordenação normativa entre a Diretiva sobre cláusulas abusivas e a Diretiva relativa às práticas comerciais desleais – uma visão coesa dos diplomas
4.1. Dimensões individual e coletiva do uso de cláusulas contratuais gerais abusivas
4.2. O conceito unitário de “deslealdade”, a aplicar em todos os Estados-Membros
4.3. A coordenação normativa entre as Diretivas
5. A aplicação complementar dos diplomas comunitários e nacionais. As prerrogativas postas à disposição do consumidor aderente: aspetos práticos
6. Conclusão
Bibliografia