ANO 2015 N.º 2
ISSN 2182-9845
Aristides Manuel da Silva Rodrigues de Almeida
Responsabilidade civil; Pedido infundado de insolvência; Apresentação indevida à insolvência; Responsabilidade por actos processuais; Responsabilidade por dolo ou mera negligência; Danos indemnizáveis
O artigo 22.º do CIRE representa no nosso sistema jurídico uma previsão de responsabilidade civil, especial relativamente ao artigo 483.º do Código Civil, que não se confunde nem se reconduz a um fundamento de mera responsabilidade processual, designadamente por litigância de má fé, com a qual pode perfeitamente coexistir e cumular-se. O pedido infundado de insolvência é aquele que carece de fundamento, que é deduzido sem que ocorram os factos que integram a previsão legal de insolvência. A apresentação indevida é o pedido do devedor tendente à sua própria declaração de insolvência sem que esteja verificada a situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas.
Fundando-se o pedido num dos factos indiciários da insolvência previstos no CIRE, não haverá responsabilidade do requerente se aqueles factos vierem a ser demonstrados mas a insolvência acabar por não ser decretada, designadamente porque o credor provou que apesar disso é solvente. Se o pedido for procedente, o devedor que pretenda demonstrar que o pedido era infundado e exigir responsabilidade do requerente terá de requerer e obter previamente a revisão da sentença que decretou a insolvência, reunidos que sejam os requisitos do recurso de revisão.
O artigo 22.º do CIRE não é uma norma especial relativamente à norma geral do artigo 484.º do Código Civil, pelo que não afasta a aplicação desta previsão específica de ilicitude nos casos em que o requerimento de insolvência se funde em factos falsos capazes de afectar o crédito e o bom nome do devedor requerido. Nesses casos, o interessado pode deduzir um pedido de indemnização cumulando os dois fundamentos de responsabilidade, circunstância em que o responsável responde pelas consequências do pedido infundado, mesmo que tenha actuado apenas com mera negligência. Se a insolvência é requerida pelo credor apenas são indemnizáveis os danos sofridos pelo devedor; quando é o devedor a apresentar-se à insolvência só são indemnizáveis os danos sofridos pelos credores.
O artigo 22.º do CIRE confere a danos situados na esfera da relação creditícia protecção delitual que de outra forma não teriam, mas isso não transforma a norma numa previsão especial de tutela delitual de danos económicos puros que permita a qualquer terceiro afectado nos seus interesses pela declaração de insolvência accionar esse mecanismo de responsabilidade. A responsabilidade prevista na norma tem como requisito o dolo – em qualquer das suas modalidades – do autor na formulação do pedido, não bastando para o efeito que ele tenha actuado com mera negligência, ainda que grosseira, solução que apenas se pode defender de lege ferenda.
1. Introdução
2. Da responsabilidade por actos processuais
3. A norma
4. Da ilicitude
4.1. A ilicitude em geral
4.2. O abuso do direito
4.3. Ofensa do crédito ou do bom nome
4.4. os danos económicos puros
5. A natureza dogmática da responsabilidade
6. O Facti-Species da norma
7. A relação entre o art. 22.º do CIRE e o art. 484.º do Código Civil
8. Os titulares do direito de indemnização
9. A restrição da responsabilidade aos casos de dolo
10. Conclusões
Bibliografia
Jurisprudência