ANO 2014 N.º 3

ISSN 2182-9845

EDITORIAL

Miguel Pestana de Vasconcelos

A Doutora Maria Raquel Guimarães teve a gentileza de me dirigir um convite para escrever o editorial da RED, revista a cujo conselho editorial e de redação tenho a honra de pertencer.

Vejo com muita satisfação, e um legitimo orgulho, que a RED, completamente inovadora no âmbito nacional, e afinando o diapasão pelos mais exigentes padrões internacionais, cresce e se afirma como uma referência nas áreas jurídico-económicas e jurídico-empresariais. O facto de ter já fôlego suficiente para lançar uma edição temática é bem prova disso.

Não me caberá fazer a apresentação, nem dos autores, nem dos textos, já devidamente avaliados e escrutinados.

Por isso, passarei a tecer algumas curtas considerações sobre concorrência e mercado.

Numa economia de mercado é essencial garantirem-se os instrumentos que permitam a livre concorrência. Não o sendo, de forma direta, ou indireta, sob variadas formas, caímos em situações de abuso.

Contudo, nesta matéria é do maior relevo - não, só claro, mas especialmente aqui - distinguir a Law in the books da Law in action. Os diversos regimes que regulam esta matéria de pouco valem se não forem acompanhados da imposição da sua observância pelos entes públicos, a quem essa missão é cometida. O que implica autoridades vigilantes, bem apetrechadas em termos técnicos e, o que não é menos, com vontade de intervir. Tanto mais que os diversos regimes são difíceis de aplicar.

Um outro aspeto prende-se com a visão, ainda prevalecente, do mercado - que é sempre pressuposto em livre concorrência – como instrumento adequado para se chegaram às soluções mais eficientes, corrente que lança as suas raízes na escola da análise económica do Direito. Rejeita-se assim qualquer intervenção do Estado, que, nesse entendimento, seria um obstáculo a alcançar tal desiderato.

Não acompanho esta forma de ver as coisas.

O valor central do Direito é a Justiça, não a eficiência económica. Esta é seguramente útil para se alcançar a primeira, mas não se pode de forma alguma sobrepor a ela. O homem é muito mais do que um simples homo economicus.

Mas, acrescentava, esta perspetiva tem tido resultados extremamente perniciosos no que toca à tutela das partes mais fracas. Com exceção do direito do consumo, o Estado tem colocado de lado, em nome da desregulamentação, regimes protetores da parte mais débil, sempre no pressuposto, errado, de que o mercado, em livre concorrência permite alcançar os melhores resultados. Não é assim, e constitui tarefa indeclinável do legislador criar instrumentos normativos, em particular tipos contratuais, onde sejam cuidadosamente ponderados os interesses e protegidos de forma equilibrada aqueles que necessitam de proteção. Essa sempre foi, e será, uma tarefa essencial do Direito.