ANO 2022
ISBN 978-989-746-318-1
Luísa Neto • Guilhermina Rego • Rui Nunes
direito; bioética
Nota de Abertura
A pandemia causada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e a doença associada COVID-19 transformaram radicalmente o mundo, e em planos muito distintos. Por um lado, o planeta ficou subitamente mais pequeno dado que, pelas suas características, a pandemia foi, e ainda é, um fenómeno global que ataca todos sem distinção. Pelo que é urgente reformular as respostas globais e as instituições de governação internacional que lhe servem de suporte. Neste e em outros domínios como a ação climática, a proteção dos fundos marinhos ou as políticas migratórias.
Mas, por outro lado, o mundo ficou mais distante, dado que a partilha de conhecimento científico e, sobretudo, o acesso a fármacos e à vacinação foram efetuados de um modo incompatível com uma visão de justiça global que todos partilhamos. Temos, coletivamente, que fazer melhor no futuro, apesar de ser de realçar a existência de esforços relevantes para os países em desenvolvimento como a COVAX (COVID-19 Vaccines Global Access), iniciativa internacional para promover um acesso equitativo à vacinação, envolvendo diferentes parceiros como a Organização Mundial da Saúde, a UNICEF, ou a CEPI (Coalition for Epidemic Preparedness Innovations) e a GAVI (Fundação Bill e Melinda Gates). Trata-se de um excelente exemplo de um esforço internacional solidário para a promoção da saúde global. No plano europeu a União Europeia da Saúde foi outra importante evolução para unir povos com tradições históricas e culturais substancialmente diferentes. E para prevenir futuras catástrofes desta natureza.
A pandemia por COVID-19 demonstrou, também, aquilo que muitos sabiam e outros não queriam ver. A importância de um Estado social forte, robusto e resiliente de modo a fazer face a problemas de saúde e de saúde pública que necessitam de esforços intersectoriais coordenados nas áreas da saúde, segurança social, educação, logística, etc. A mensagem pós pandémica é, então, o reforço dos sistemas de proteção social, a universalidade no acesso à saúde e a importância de uma boa e moderna gestão pública. Pelo que a questão já não é a legitimidade do Estado social em si, mas o modo como deve ser otimizado o modelo de bem-estar social existente em cada país, para servir todos sem qualquer tipo de discriminação.
Mas, pensar o futuro pós-pandémico é pensar em uma nova fase dos direitos humanos, direitos bem patentes por exemplo na Carta Internacional de Direitos Humanos, refinamento progressivo da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Porquê, porque é necessário consolidar globalmente, entre outros, o direito à proteção da saúde, ou porque é fundamental desenhar modelos de priorização ética para não discriminar infundadamente ninguém, devido por exemplo à idade, ao género ou ao nível de rendimento.
Estas e outras reflexões não podem esquecer, também, a vertiginosa transição digital operada ao longo do último ano e meio. Nada fica igual com o recurso sistemático à tele-medicina e a outras modalidades de e-saúde, com o advento da inteligência artificial e dos respetivos algoritmos que percebem e interpretam as nossas emoções, com a robótica automatizada e seu impacto no mundo laboral. Potenciando o advento de novas desigualdades, agora de base tecnológica, e desligadas do tradicional conceito de Estado nação. O impacto das plataformas digitais globais na vida e na saúde necessita, também, de uma reapreciação global, e de novos instrumentos regulatórios para proteger aquilo que temos de mais íntimo, a nossa vida, a nossa privacidade e a nossa liberdade.
Estes e outros temas servem de base a uma reflexão que o 17º Congresso Nacional de Bioética pretende levar a cabo, una iniciativa conjunta da Faculdade de Direito e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, do Centro de Investigação Interdisciplinar em Justiça e da Associação Portuguesa de Bioética. Congresso que conta com destacados membros da academia Portuguesa e Brasileira, e com ilustres figuras no panorama europeu, nos domínios científico, jurídico, e da formulação de políticas públicas.
Pelos temas que aborda, pelas personalidades que o integram, e pelo debate que irá seguramente suscitar o 17º Congresso Nacional de Bioética pode ser considerado como o congresso da esperança. A esperança numa globalização mais justa, na construção de sociedades mais solidárias, e de um desenvolvimento científico e tecnológico com verdadeiro rosto humano.
Porto, 26 de novembro de 2021
A Comissão Organizadora
Luísa Neto . Guilhermina Rego . Rui Nunes